O mundo pode ser um palco, mas o elenco é um horror. (Oscar Wilde)
Quem dera fosse ao menos a bunda redunda de Drummond
por Aline Menezes
Na TV, tenho acesso apenas a canais abertos, o que significa dizer que, aqui em casa especificamente, restam-me cinco opções clássicas: SBT, Record, Globo, Rede TV! e Band. Assim que liguei a televisão ontem à noite, fui surpreendida com a imagem de uma bunda gigante num movimento um tanto quanto eroticamente [in]expressivo, balançando ao som de Mc Pocahontas (sim, o calendário maia não deveria falhar!).
Sinto que envelheci de modo precoce, como se tudo fosse sempre cansativo demais, desgastante demais, patético demais já há algum tempo… É insuportável imaginar que o contingente de pessoas e experiências interessantes no mundo tornou-se reduzido, a julgar pela TV aberta, pelo Facebook e pelo Brasil. Não por acaso, ouvi dizer que tenho “um espírito velho”, reencarnado muitas vezes (deve ser um espírito demasiadamente teimoso).
Há entre nós quem tem medo de envelhecer. Associamos equivocadamente que a velhice está associada unicamente à osteoporose, à diminuição da nossa capacidade de enxergar de perto e da nossa força muscular… à flacidez de nossa pele e à perda gradual da memória, por exemplo. Eu não tenho. Na verdade, nunca tive.
É, nunca tive medo de envelhecer, mas deve ser porque ainda não vi os efeitos da velhice tomarem conta do meu corpo de modo tão mais evidente… talvez porque os meus seios ainda não estejam alcançando o umbigo, talvez porque as rugas do rosto não estejam aparecendo ainda, talvez porque eu não esteja com cabelos brancos enfeitando o couro cabeludo… talvez.
Porém, o que espero mesmo, independentemente do tempo, é preservar minha paixão pela vida, apesar do sofrimento no mundo; pelos sentimentos das pessoas, apesar do mau-caratismo; pelo amor, apesar das decepções amorosas; pela alegria, apesar das dores; pelas relações afetivas, apesar da solidão; pela família, apesar dos ressentidos; por tudo que é belo, apesar das almas deformadas; pelo outro, apesar de mim.
Espero mesmo que numa outra ocasião eu possa escrever motivada por um grande artista do momento, por uma música magnífica, por um livro que integrará a tradição literária mundial, por um filme brilhante… que numa outra ocasião eu não precise da abundância televisiva e gratuita de programações estúpidas para falar sobre a escassez…
… para falar sobre a escassez da vida.
Também sofro de envelhecimento precoce e, assim, como você, o mundo me cansa.
Bela reflexão! shortage e escassez de vida, ótima escolha de palavras.
Aline, o espírita acertou quando disse que você tem predição por pessoas mais velhas. Isso ele acertou em cheio! No quesito enjoo televiso e das “baboseiras” do cotidiano, concordo contigo: está difícil conviver com a escassez de cultura das pessoas. Aqui, por exemplo, é fato: facebook e música sem qualidade. E o pior: se você não faz parte “dessa cultura”, você é diferente da grande maioria. É lamentável!
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