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A educação é uma coisa admirável, mas é bom recordar que nada do que vale a pena saber pode ser ensinado. (Oscar Wilde)

Sob os pés os paetês de brilho fácil
por Aline Menezes

Aproxima-se o início de mais um ano. Por conta disso, é comum as pessoas se sentirem ou nostálgicas ou cheias de esperança pela possibilidade de dias mais festivos e menos difíceis. Transitamos entre a melancolia do dia a dia e a euforia do amanhã, entre o cansaço deste ano que se vai e a energia milagrosamente renovada para o ano que virá. Essa espécie de experiência sazonal pode ser vivida por qualquer um de nós, porém, o que mais me chama a atenção neste período do ano é a maneira como nos esquecemos de que, durante todos os outros dias pelos quais passamos, fomos ironicamente impassíveis.

Nas redes sociais, vimos como a dor alheia, a violência generalizada e a estupidez humana transformam-se em memes diariamente. Vimos como não nos interessa, por exemplo, a notícia de que, no Brasil, em 2012, houve quase 51 mil registros de casos de estupro, número que equivale a um aumento de 20% em relação a 2011. Vimos como é patético um homem, aparentemente ingênuo e inofensivo, admitir/revelar/contar/dizer numa entrevista a uma revista igualmente duvidosa que ele gasta R$ 50 mil numa balada. De repente, a julgar pela repercussão disso, todos se deram conta de que nada nos parece tão idiota como a ideia de sucesso e felicidade associada às noitadas nos camarotes da vida.

Tanto na imprensa nacional como nas salas de aula, se pensarmos em “espaços” que supostamente nos levariam a mudar nossa relação com o mundo, o que parece sobressair é o modo descuidado com o qual nos conduzimos no dia a dia. As notícias são as mais irrelevantes possíveis e são reproduzidas velozmente e sem nenhum pudor pelos jornais, TV’s, agências de notícias, rádios e revistas brasileiras… Nas faculdades, professores se esforçam para não parecerem tão imbecis ao acreditarem que obras literárias podem denotar ainda algum valor entre nós…

Talvez realmente não faça mais sentido a leitura de livros como “O retrato de Dorian Gray”, de Oscar Wilde; “A gaivota”, de Anton Tchekhov; “A hora da estrela”, de Clarice Lispector; “Memórias póstumas de Brás Cubas”, de Machado de Assis… Talvez realmente não faça mais sentido a leitura de nada mais que não sejam os trending topics do Twitter ou as últimas atualizações do Facebook. Talvez realmente não faça mais sentido incomodar-se com a ausência de sensatez, com a falta de disposição das pessoas de refletirem sobre a nossa estupidez, de tentarem mudar os abismos para os quais somos brutalmente empurrados.

Nas postagens diárias, o que vemos são pessoas infantilizadas por um clique em frente ao espelho. São homens e mulheres que demonstram a necessidade narcisística de parecerem cada vez mais belos e mais atraentes. Pessoas sendo devoradas pela ideia equivocada e distorcida de que é necessário receber centenas de elogios para nos sentirmos melhores e mais populares. Como se, com isso, o nosso cérebro e o nosso coração fossem se adequar à genuína necessidade que temos de tocar a vida de um modo menos bruto, menos estúpido, menos patético e muito mais real.

Como se, pelos filtros do Instagram, fosse possível alterar as cores da nossa frustração, da nossa angústia, dos nossos dilemas e do nosso mais pueril desejo de receber afeto. Como se, ao apertar o botão excluir, fosse possível descarregar dos nossos ombros o peso de sermos quem somos. Ou a dor de não mais podermos dizer…

… quão infelizes estamos.

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