Eleições 2014

A escola não é de modo algum o mundo, nem deve ser tomada como tal; é antes a instituição que se interpõe entre o mundo e o domínio privado do lar. (Hannah Arendt)

Dilma, Marina e Luciana
(Carta aberta aos meus amigos)

por Aline Menezes

Há alguns anos, Marina Silva e eu participamos de um mesmo seminário: debates sobre a obra de C. S. Lewis, na Igreja Presbiteriana de Brasília, ministrados pela doutora em história e filosofia da educação pela USP, professora Gabriele Greggersen. Numa entrada discreta, silenciosa, Marina Silva sentou-se do meu lado. Cumprimentou com um sorriso aquelas pessoas que logo a reconheceram. Admiro aqueles que lutam por justiça social, admiro pessoas que respeitam o direito à diversidade e que, sobretudo, têm uma história de vida comprometida com as causas do outro. Marina tem o meu respeito e a minha admiração, mas não votei em Marina.

Quando trabalhei como jornalista numa assessoria na Câmara dos Deputados, durante quatro anos, acompanhei entrevistas coletivas dadas por vários políticos, dos mais cínicos aos mais comprometidos, incluindo Luciana Genro. Acompanhei algumas sessões sobre movimentos sociais e organizações de trabalhadores e sempre observei a postura de Luciana Genro com as questões nas quais ela acredita e pelas quais ela luta e defende. Luciana Genro tem o meu respeito e a minha admiração, mas não votei em Luciana Genro.

Durante outros quatro anos como jornalista, viajei por todas as cinco regiões do Brasil. Entrevistei famílias pobres, entrevistei mulheres agredidas pelos maridos, entrevistei famílias de crianças abusadas sexualmente, entrevistei idosos que hoje têm um mínimo de tratamento digno no interior do país, entrevistei adolescentes e jovens filhos de empregadas domésticas que hoje estudam em faculdades de qualidade. Todas essas pessoas que entrevistei tiveram melhorias significativas na vida, graças a políticas públicas efetivas que têm como objetivo garantir direitos e assegurar oportunidades. Votei em Dilma Rousseff. Votei em alguém que está à frente de muitas lutas sociais, que parecem ser invisíveis aos olhos de muitos eleitores, porque são eleitores que reproduzem clichês, que têm uma forma enviesada de avaliar um governo.

Desde muito nova, cresci num ambiente no qual, de um lado, havia uma pessoa crédula, amorosa, cheia de fé: a minha mãe; do outro, uma pessoa sem religião e que nunca falava sobre Deus, politizada e questionadora: o meu pai. Ambos exerceram a maior e mais importante influência em minha vida. Desde cedo, sempre gostei da maneira como o meu pai discutia política e como criticava o comportamento da elite conservadora do nosso país. Um homem inteligente e que não aceita trocar o seu voto para benefício próprio.

O que sempre me fez compreender que o caráter não depende de religião. Nunca dependeu. Nunca dependerá. Motivada por um senso de justiça social, eu jamais votaria em candidatos que me oferecem algum benefício pessoal em troca do meu voto; jamais votaria em alguém que não tem consciência do que seja política para o desenvolvimento humano. E é por isso que eu votaria em Luciana ou em Marina. Mas votei em Dilma.

As razões que me levaram a votar em Dilma Rousseff são várias e em nada se comparam às tolices que circulam e circularam pela Internet durante este primeiro turno. Nestas eleições, percebi o quanto há eleitores desinformados. Pessoas que nunca sequer leram sobre política, não conhecem as realidades brasileiras e estão preocupadas muito mais em agredir, em grunhir, em vociferar. Exemplo disso está bem representado na figura de Silas Malafaia, que – na minha opinião – tem demonstrado ser uma das pessoas mais estúpidas do meio religioso. Um homem que dissemina o ódio e distorce completamente tudo que não acolhe os interesses dele. Uma pessoa que em nada recebe meu respeito. Lamento que ainda haja pessoas bem intencionadas que acreditam na percepção adoecida e doentia dele.

Votei em Dilma Rousseff porque busco ser coerente com o que penso sobre a vida, sobre a política, sobre justiça social, sobre a nossa relação com o mundo, sobre tudo aquilo que me motiva e me leva a entender a dor do outro, a compreender a necessidade do outro, a pensar no outro.

Nestas eleições, percebi o grau de imbecilidade de muitos eleitores; observei o tamanho da ignorância de muita gente; notei que algumas pessoas são bastante perigosas, pois têm como motivação na vida o preconceito, o racismo, a discriminação, o ódio, a raiva, o ressentimento. Pessoas que não têm condições nenhuma de debater de maneira madura e respeitosa com quem pensa de forma diferente. Pessoas com quem não pretendo criar vínculos mais afetivos. Pessoas com quem não pretendo criar nenhum vínculo.

Mas também encontrei raras pessoas que, embora tenhamos pensamentos distintos, querem apenas um país melhor, um mundo melhor, uma vida melhor para todos nós. Pessoas que, ainda que não tenham lido nada sobre Hannah Arendt, por exemplo, parecem compreender algo que julgo fundamental:

“O sentido da política é a liberdade”.

 

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Texto divulgado nas redes sociais, pela primeira vez, em 5.10.2014.

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