Nesta quinta-feira (4/6), em sua conta no Instagram, a professora e pesquisadora da Universidade de Brasília (UnB), Débora Diniz, leva-nos a pensar sobre o que representa a escalação de uma equipe de jornalistas negros, na edição de ontem do programa “Em Pauta”, da GloboNews. Para além do que o noticiário tem chamado de “autocrítica”, a antropóloga sugere outras palavras para refletirmos sobre o tema. Leia a seguir!
TEXTO SEM TÍTULO
por Débora Diniz*
Queria estranhar a palavra “autocrítica”. Ontem a TV Globo fez um debate só com jornalistas negros — falaram de racismo, discriminação, barreiras injustas. Para espezinhar o patriarcado racista, a maioria era de jornalistas mulheres.
As notícias falam de “autocrítica da Globo”. Talvez tenha sido vergonha, pedido de desculpas ou reparação histórica, tentativa de transformação ou mudança. Há outras palavras — morais e políticas — mais apropriadas que autocrítica.
Foi preciso a força das ruas, a persistência dos movimentos sociais de pessoas negras, os grupos anti-racistas, incansavelmente, interpelarem a Globo sobre representatividade nas novelas, sobre subalternidade dos negros como atores, sobre a inexistência de corpos pretos na voz de sabedoria dos jornalistas para que chegássemos ao dia de ontem.
Não foi um processo de autodescoberta. Foi longo, intenso e insistente. Foi de fora para dentro. Foi uma interpelação, mas de vozes que não eram reconhecidas como o poder de interpelar para o giro de resposta, segundo a alegoria de Althusser. As interpelações sobre onde estavam os corpos negros na Globo foram ignoradas até então, pois não perturbavam a ordem estética e ética de aparição. Mas algo mudou.
É certo que o processo final de transformação para a cena de ontem exige uma fase interna de acolhimento da interpelação. Não somos seres ou organizações iluminados para a autocrítica. Somos interpelados a ela. E uma hora, fazemos o giro da história.
* @debora_d_diniz é antropóloga, professora e pesquisadora da Universidade de Brasília (UnB).
